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Assembleia de condomínio edilício é soberana ou isso é um mito?

Artigo escrito por Elcio Nacur Rezende.

Pensa-se, costumeiramente, que é possível aos condôminos deliberarem sobre quaisquer assuntos atinentes aos edifícios que ocupam, sem observar os limites jurídicos. Observa-se que muitas pessoas ainda acreditam que se todos os condôminos edilícios ou a sua maioria, decidem algo, esse ato adquire efeitos de decisão jurídica. Todavia, é um equívoco pensar assim.

A assembleia é o órgão máximo deliberativo da administração de um condomínio edilício. Ela deve ser acompanhada por todos os condôminos e ocorrer no mínimo uma vez por ano para a aprovação do orçamento de despesas, recolhimento de contribuições dos moradores, prestação de contas e, eventualmente, eleição de síndico substituto e alteração de regimento interno, conforme prevê o artigo 1.350 do Código Civil.

Contudo, várias situações não podem ser objeto de decisão assemblear, ainda que tomadas por unanimidade.

Antes de tudo, é necessário explicar que a regra escolhida pela lei para o rateio de despesas é a fração ideal de cada condômino. É importante ressaltar essa informação porque se o proprietário de um dos apartamentos de um condomínio tiver em sua matrícula imobiliária o número 0,1 como fração ideal e o seu vizinho possuir o número 0,15, o último pagará 50% a mais de taxa condominial. Não cabe à assembleia – ainda que a maioria de seus participantes deseje – alterar essa regra, exceto se dois terços dos condôminos, como já visto acima, decidirem modificar a convenção de condomínio.

A segurança de uma edificação, por sua vez, não é interesse apenas dos proprietários de unidades condominiais e sim de toda a comunidade. Afinal, vidas podem ser ameaçadas por construções irregulares e, vale dizer, vidas não somente daqueles que ocupam um edifício e sim de transeuntes e vizinhos. Portanto, além da autorização assemblear, uma obra em qualquer unidade é carecedora de cuidados que perpassam por análises de profissionais qualificados que se responsabilizarão por eventuais modificações.

Não se pode modificar as formas e as cores de uma fachada, suas partes ou esquadrias externas, ainda que a unanimidade dos condôminos queira. É relevante registrar que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) em uma decisão anterior, exigiu a presença de todos os condôminos para ressaltar que no interesse da municipalidade não se poderia alterar a fachada de um condomínio.

Para se construir algo é imprescindível a autorização governamental – comumente chamada de alvará de construção – e essa só é emitida quando a obra está em consonância com a Lei de Uso e Ocupação do Solo (Luos).

Os municípios possuem, com algum grau de complexidade, uma série de normas que estabelecem os padrões construtivos admitidos de acordo com cada região e organização urbanística – zona residencial, comercial, industrial, mista, etc. Neste conjunto de diretrizes estão fixadas as extensões adequadas para uma construção, as regras de destinação, a importância da preservação ambiental e histórica, leis de trânsito, os modelos estéticos aceitos, dentre vários outros fatores que devem ser levados em consideração durante o planejamento de uma obra em determinadas cidades ou estados.

Por consequência lógica, a alteração da forma e da cor de uma fachada, suas partes e esquadrias externas somente é possível com autorização governamental da municipalidade!

Com a mesma linha de raciocínio, alterar a destinação de uma edificação e permitir o uso prejudicial ao sossego, salubridade e segurança dos possuidores ou aos bons costumes, não depende de decisão assemblear e, sim, de poder estatal.

Outro exemplo de fácil percepção seria a admissão da construção de um andar superior, além do admitido pelo município por ocasião do habite-se. Ainda que a unanimidade queira, tal construção poderá trazer problemas de segurança arquitetônica à edificação. Se eventualmente ela vier a desmoronar, prejudicará não somente os moradores, mas também a vizinhança e transeuntes.

Animais domésticos, ainda que admitidos, também não podem trazer problemas de segurança, sossego e salubridade. Dessa forma, ainda que a maioria dos condôminos queira permitir que determinados animais residam em um apartamento, mesmo sabendo que um morador ou vizinhos de outros edifícios podem ser incomodados, a decisão da assembleia não se sustentará, sob pena de inversão de valores jurídicos na medida em que a valoração do bem-estar humano é, inexoravelmente, mais tutelada que de um animal não humano.

Dezenas de outros exemplos poderiam ser dados para demonstrar as várias limitações que a assembleia condominial está adstrita.

Em conclusão, pode-se afirmar que a assembleia condominial não é soberana. Sendo assim, é preciso que esse entendimento anacrônico seja superado, visto que as relações privadas não se baseiam unicamente no clássico princípio da autonomia das vontades e, sim, na autonomia privada que, sem dúvida, possui um espectro maior e mais atual de juridicidade. 

Elcio Nacur Rezende, doutor em Direito, professor da Escola Superior Dom Helder Câmara e da Faculdade de Direito Milton Campos.

Escrito por Redação

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