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Contratos de Franquia / Franchising conforme a Nova Lei 13.966/2019 à luz do atual cenário: COVID -19

Este artigo trata da nova lei de franquia, 13.966, de 26 de dezembro de 2019, que entrou em vigor em 27 de março de 2020, que revogou a lei 8955 de 15 de dezembro de 1994, trazendo consigo algumas inovações, assim como alterações de termos ou expressões de modo a consolidar posicionamento jurisprudencial uniforme e, em muitos outros aspectos, o legislador manteve conquistas importantes trazidas pela lei anterior.

É importante que as partes empresárias procurem se manter atualizadas nas mudanças da legislação para terem um bom desenvolvimento do seu negócio e não correr o risco de que posteriormente o contrato seja passível de nulidade ou anulabilidade, acarretando outras consequências jurídicas e pecuniárias. 

Uma vez explanado isso, no que refere às inovações da nova lei de franquia, abordaremos a problemática da lei vigente no atual contexto, a pandemia do covid-19, assim como, as ferramentas que as partes tem para não saírem mais prejudicados do que provavelmente já estão.

No primeiro momento, não está demais perguntarmos se era necessário ou não a alteração da lei. 

A resposta é afirmativa, já que a lei revogada data do ano 1994, estamos em 2020, são mais de 25 anos de vigência dessa lei e, por obvio, durante todo esse tempo a sociedade muda e foi preciso que a lei se atualize em relação a algumas transformações no mercado e na relação comercial, empresarial e tecnológica e, por óbvio, o direito tem que acompanhar as mudanças da sociedade, senão, perde sua essência e torna-se inaplicável. 

A nova lei das franquias vem para trazer mais transparência para os negócios firmados entre franqueadores e franqueados, agregando oportunidades e segurança jurídica para as partes envolvidas, trazendo punições por omissão ou pela veiculação de informações falsas na Circular de Oferta de Franquia, além de validar a possibilidade de escolha de juízo arbitral para dirimir eventuais questões entre as partes, como veremos no desenvolver do presente artigo.

O presidente da Associação Brasileira de Franchising, André Friedheim, entende que as mudanças acontecem em um momento importante e vão favorecer o setor como um todo, assim o explica:

A Lei do Franchising de 1994 teve um papel fundamental no fortalecimento do nosso mercado. Era uma lei simples, direta e que previa condições equilibradas para que os entes privados realizassem negócios de forma transparente e segura. No entanto, após mais de 20 anos, atualizações eram necessárias. Com esta nova regra, conseguimos manter as conquistas originais, deixar mais claros alguns pontos e acrescentar dispositivos que podem acelerar, por exemplo, a abertura de novos unidades e, portanto, o crescimento do setor como um todo.[i]

A respeito da nova lei de franquia, comenta o jurista Silvio Venosa:

A nova e recente lei de franquias objetiva dinamizar a utilização do instituto, como meio econômico de prestação e produção de serviços e bens. Franchise, em inglês, provém do verbo francês, franchir, que significa libertar ou liberar, dar imunidade a alguém originalmente proibido de praticar certos atos. Daí o termo franchisage, correspondente ao privilégio que se concedia na Idade Média a cidades e súditos. Tem a compreensão de um privilégio concedido a uma pessoa ou a um grupo. Juridicamente, portanto, franquia significa um direito concedido a alguém.2

Além disso, estamos num contexto diferenciado, atípico, a pandemia do Covid – 19, onde as decisões a serem tomadas pelos empresários precisam de maior cautela, uma vez que, o Covid -19 no mundo empresarial gerou a impossibilidade do cumprimento dos contratos. Nesse sentido, as partes empresárias, devem pensar que somos uma rede contratual e, portanto, cabe uma solução plural, pensando em todos. 

O contrato de franquia, também conhecido por “Franchising”, nas palavras de Nelson Zanzanelli, “é uma forma de distribuição de bens e serviços na qual o franqueador vai ceder o direito de uso, por meio de situações pré-estabelecidas e, o não cumprimento, dá direito a rescisão contratual (informação verbal).”[ii]

Conforme verificaremos a seguir, o legislador ampliou o conceito de franquia empresarial, dando assim, maior campo de atuação.

Ao conferirmos o caput do artigo 1° da lei de franquia vigente, podemos destacar as seguintes inovações:

        1. Ampliação do conceito de franquia e a consequente ampliação do campo de atuação. 
        1. Descaracterização de relação de consumo entre franqueado e franqueador.
        1. Descaracterização de vínculo de emprego não apenas entre franqueado e franqueador, mas entre os funcionários do franqueado e o franqueador, inclusive no período de treinamento.

Se compararmos o conceito de franquia estabelecido no artigo 1° da lei vigente com o conceito definido no artigo 2° da lei revogada verificamos que o conceito de franquia empresarial baseava-se na concessão do direito de usar a marca ou patente, bem como a distribuição exclusiva ou semiexclusiva do produto ou serviços e o know-how. 

A nova lei substitui o termo “patente” por “propriedade intelectual”, o que, como mencionamos, gera uma ampliação do conceito de franquia, já que inclui, por exemplo, direito autoral, não só patente, isso porque propriedade intelectual é gênero, e direito autoral espécie.

Dessa forma, a modo de exemplo, a lei de franquia vigente está caracterizando a possibilidade de ceder um software que é produzido por meio de um contrato de franquia e criar uma relação contratual pautada na ideia do direito autoral, uma vez que, no Brasil o direito autoral é o instituo responsável pela proteção do software. 

Outro detalhe que merece relevo, são as alteração do termo “cede” por “autoriza”, o que conceitualmente é o termo mais apropriado para propriedade industrial uma vez que o direito de uso não é cedido e sim autorizado. Da mesma forma, o legislador modificou o termo “semiexclusiva” por “não exclusiva”, outorgando total liberdade às partes o que se refere a exclusividade.

Continuando com o artigo 1° da lei de franquia vigente, verificamos mais uma inovação quando o legislador estabelece que não deve ser caracterizada relação de consumo no tipo de contrato de franquia. 

É importante mencionar que a jurisprudência de forma pacifica não reconhece relação de consumo entre franqueado e franqueador, porém o legislador decidiu tornar lei aquilo que já é de entendimento jurisprudencial pacifico, para evitar qualquer dúvida a respeito e também, eventuais ações sob esse pedido.  

No entanto, embora não seja reconhecida a relação de consumo, existe um contrato de adesão que recebe a proteção na medida da legislação, regido no artigo 423 do Código Civil, que estabelece que havendo dúvida na interpretação de um contrato de adesão, a ambiguidade será interpretada a favor do aderente, neste caso, do franqueado; ainda, conforme especificado no artigo 424 do Código Civil, o contrato de adesão não pode ter renuncia antecipada a direito previsto na legislação. 

No artigo 1° da lei em vigência, também verificamos que o legislador inova deixando claro que não existe relação trabalhista entre franqueado e franqueador, nem mesmo entre os funcionários do franqueado e o franqueador, inclusive no período de treinamento, uma vez que, na legislação anterior descaracterizava apenas o vínculo empregatício entre franqueador e franqueado, contudo, na prática era corriqueiro as demandas judicias pedindo o reconhecimento de vínculo empregatício entre os funcionários do franqueado e o franqueador, ou até mesmo, entre franqueado e franqueador, por esse motivo, o legislador entendeu importante mencionar e frisar logo de início a inexistência empregatícia entre essas partes mencionadas, inclusive no período de treinamento, isto porque é natural que o franqueador compareça no momento do treinamento aos empregados, para colocar as diretrizes e os padrões adotados pela franquia.

No entanto, é de conhecimento geral o sistema protetivo dos tribunais trabalhistas, por isso, não deixa de ser uma incógnita o posicionamento que será adotado diante da atualização da lei. Venosa refere:

A atual lei de franquias excepciona no tocante aos empregados do franqueado, isentando o franqueador das responsabilidades trabalhistas. Os tribunais do trabalho têm tido, contudo, tendência de sempre ampliar as responsabilidades da empresa em prol da proteção maior ao trabalhador. Vejamos quais será o sentido dos julgados perante o texto expresso na nova lei.[iii]

Continuando com a explicação da nova lei, passamos a observar que nos parágrafos §§ 1° e 2°do artigo em estudo, verificamos as seguintes inovações:

        1. a) A possibilidade de a pessoa que ainda não é titular definitiva, mas requerente dos direitos do contrato de franquia, poder franquear
        1. b) A possibilidade de que uma empresa pública possa realizar um contrato de franquia.

No parágrafo primeiro do artigo 1° da atual lei de franquia, o legislador mais uma vez, consolidou uma posição jurisprudencial, já que antes existia a dúvida se uma pessoa que apenas fez o depósito da marca perante o Instituto Nacional de Propriedade Industrial – INPI -, poderia franquear ou não. 

A dúvida baseia-se em que o aspirante a franqueado ainda não se encontra na situação de titular definitivo da marca, no entanto, a lei nº 9.279, de 14 de maio de 1996, que regulamenta a propriedade industrial, já autorizava o depositante a fazer esse tipo de contrato para exploração da marca. Na atual lei de franquia, temos previsão a respeito, ou seja, poderá ser franqueador aquele que ainda não é titular definitivo da marca, porém requerente dos direitos do contrato.

Outra inovação importante é que a atual lei no seu parágrafo segundo do artigo 1° regulamenta que o sistema de franquia poderá ser exercido em face da administração pública, como por exemplo empresa de telefonia, ou até mesmo, entidade sem fins lucrativos, como ONG´s, o qual gera, uma expansão das empresas de franquia. 

Neste sentido, não está demais falarmos, sem medo de errar, em uma evolução jurídica, que sem sobra de dúvidas, gerará muitos benefícios para a sociedade assim como para o Estado. São as palavras de Di Pietro: 

Não é demais lembrar que o surgimento de novos modelos contratuais no âmbito da Administração Pública corresponde à evolução do direito administrativo, principalmente na parte dos contratos. Enquanto no direito administrativo tradicional, mais autoritário, prevaleciam os atos unilaterais da Administração, hoje a tendência é no sentido da preferência pelos contratos.[iv]

A respeito, muito optimista, ressalta o jurista Venosa:

Anote-se que a lei recente permite a contratação de franquia não somente por empresa privada, como é curial, mas também inova permitindo a participação de empresa estatal ou entidade sem fins lucrativos, independentemente do segmento em que desenvolva as atividades (art. 1º, §2º). Trata-se, sem dúvida, de importante dinamização desse negócio, que bem utilizado será segmento importante para a sociedade.[v]

 

A CIRCULAR DE OFERTA DE FRANQUIA – COF – 

O artigo 2° da lei de franquia vigente (artigo 3° da antiga lei), trata da Circular de Oferta de Franquia – COF -, que nada mais é, do que o documento mais importante na relação entre o franqueado e o franqueador, para que o franqueado tenha total conhecimento do negócio em que vai investir.

Dentre as principais mudanças referente a COF, temos:

        1. a) O documento, COF, deverá ser em língua portuguesa b) Substituição do termo “pendencias” por “ações judiciais” c) A lei exige detalhar de forma pormenorizada a COF d) Estabelecer prazo contratual, e as condições para a renovação e) Mencionar os meios de contato dos ex´s franqueados dos últimos 24 meses f) A descrição pormenorizada das despesas que o franqueado terá

g) O franqueador deverá mencionar na COF os fornecedores homologados h) A COF deverá mencionar o que é oferecido e as condições desta i) O fornecedor deverá dar suporte e treinamento aos funcionários j) Descrição detalhada no que se refere a layout k) Descrição pormenorizada das penalidades contratuais l) Cláusula de territorialidade especificando se há ou não concorrente próximo

  1. O franqueador deverá mencionar na COF se existe ou não associação dessa espécie comercial.
  2. Cabimento de anulabilidade ou nulidade jurídica, caso não cumprido os requisitos.

O artigo 2° na legislação vigente contém XXIII incisos e 2 parágrafos, o qual desde já, demonstra a sua importância e complexidade. 

Se fizermos um paralelo entre os incisos do artigo 2°da lei vigente, e os do artigo 3° da lei antiga, que tratam da Circular de Oferta de Franquia – COF -, podemos verificar que o legislador acrescentou ou substituiu termos e com isso, exigiu maior detalhe deste documento, por exemplo, logo no caput do artigo 2° da lei vigente, queda claro que a COF deverá ser escrita em língua portuguesa, ou seja, se o franqueador ou a empresa franqueada é estrangeira, o documento deverá ser obrigatoriamente em idioma português, e ainda, que seja de entendimento fácil e acessível. 

Outro ponto interessante, é que na antiga lei mencionava que era obrigação do franqueador, indicar por médio da COF as pendencias judicias que tinha em relação a marca, a nova lei substitui o termo pendencias judicias por ações judicias, isso pode gerar uma interpretação divergente na jurisprudência por exemplo no que refere a arbitragem. 

A nova lei de franquia trata de forma mais detalhada este documento, exigindo a descrição total da franquia, perfil do franqueado ideal e se o franqueado precisa atuar diretamente na operação. 

Devemos lembrar, inclusive, que tanto o franqueado como o franqueador devem estabelecer prazo contratual, assim como as condições para a renovação do contrato. 

A lei vigente, pede inclusive, a descrição pormenorizada das despesas que o franqueado terá com a franquia, estimativa do investimento inicial, aquisição, implantação, valor estimado de instalações de equipamentos, estoques, taxas periódicas como: royalties, publicidade, renovação. Isto com objetivo de que o potencial franqueado saiba exatamente a que se submete e não tenha surpresas futuras. 

Uma alteração importante é inciso X, onde estabelece que a Circular de Oferta de Franquia – COF-  deverá ter o nome, endereço, telefone, todos os meios de contato dos ex´s franqueados, que se desligaram nos últimos 24 meses (antiga legislação era de 12 meses), com a finalidade de que o franqueado tenha acesso a essas pessoas e ter uma visão interna do negócio, podendo avalia-la integralmente, e entender melhor o histórico da franquia, os motivos pelos quais algumas unidades fecharam, se foi por problema financeiro, por exemplo.

Salienta o professor Zanzanelli que: a Circular de Oferta de Franquia – COF- necessariamente deverá indicar os fornecedores homologados, para que o franqueado mantenha o padrão de qualidade pré-definido, o know-how, e comprar apenas de fornecedores homologados pela franquia (informação verbal).[vi] 

Os artigos da lei antiga e da atual, indicam que a COF deverá mencionar o que é oferecido para o franqueado, porém na lei vigente o legislador acrescentou o termo em quais condições.

Hoje preciso indicar o que é oferecido para o franqueado e em quais condições, por exemplo: Suporte, supervisão, serviço prestado ao franqueado, treinamento dos funcionários especificando duração conteúdo e custo. 

A nova lei de franquia também traz uma descrição mais detalhada do que se refere a Layout, arranjo físico de equipamentos.

A COF deverá mencionar a situação do franqueado na fase pós contratual:  multas, segredo industrial, possibilidade de concorrência findo o contrato de franquia. Tudo isso deverá estar descrito na COF trazer modelo padrão do contrato, descrição de multas, atraso de multas, atraso de royalties, multas de concorrência, etc. Prazo e condições de contrato. 

Nas palavras do professor Nelson Zanzanelli “o contrato posteriormente assinado deverá estar conforme a Circular de Oferta de Franquia – COF – onde a omissão ou mentira de algum detalhe, caracterizará nulidade jurídica, conforme definido no artigo 2° da atual lei de franquia (informação verbal)”[vii]

A Circula de Oferta de Franquia deverá mencionar a respeito da Territorialidade, já que a nova lei manteve a permissão de haver ou não exclusividade em determinada área territorial, no entanto, a inovação desse sentido é de que agora o franqueador está obrigado a esclarecer na Circular de Oferta se há e quais são as regras de concorrência aplicáveis entre as unidades próprias, franqueadas e entre os franqueados. Isso também vai ajudar o interessado e entender melhor as perspectivas de mercado e eventuais dificuldades que ele pode encontrar no que diz respeito à concorrência.

A mudança legislativa trouxe para a letra da lei a figura da associação de franqueados, que, na prática, já está presente há muito tempo nos contratos de franquia.

Ela se apresenta como uma associação que reúne os franqueados e que tem estatutos próprios que versam sobre aspectos relevantes comerciais.

Com a disposição legal acerca da existência da associação, os franqueadores devem especificar na COF informações dos poderes da entidade e de como será feita a fiscalização delas.

A COF é um pré-contrato, que deverá ser entregue ao franqueado com antecedência mínima de 10 (dez) dias (sendo a franqueadora entidade pública entregará no início do processo de seleção) e, o contrato posteriormente assinado deverá estar conforme a COF, sendo que a omissão ou falta à verdade de algum detalhe do estabelecido nos incisos do artigo 2° da lei de franquia, dará ensejo a anulabilidade ou nulidade jurídica, depende do caso e, ainda, podendo pleitear a devolução de todas as quantias já pagas. Importante mencionar que na lei revogada falava-se apenas de anulabilidade. 

O professor Zanzanelli ensina que para tal anulação ou nulidade, o deverá ser provado o vício evidente, (provando: dolo, coação, erro) isto porque o franqueado não pode alegar culpa do franqueador, já assinou, anuiu com o contrato, portanto, o franqueado não poderá requerer a rescisão do contrato por mera liberalidade, ou porque o negócio não cumpriu as expectativas dele, esse é o entendimento do Tribunal que vem prevalecendo (informação verbal) 

Ao lermos o artigo 3° da legislação em estudo, verificamos que o legislador regulamenta a sublocação de imóvel entre franqueador e franqueado, fato esse que é uma exceção da regra estabelecida na Lei do Inquilinato, inclusive no que refere ao preço estabelecido, que no caso de franquia empresarial, o inciso II do mesmo artigo autoriza a majoração do preço de aluguel, que será a favor do franqueado, desde que i) exista previsão expressa na Circular de Oferta de Franquia e no contrato; e ii) o valor pago a mais ao franqueador na sublocação não implique excessiva onerosidade ao franqueado, garantida a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro da sublocação na vigência do contrato de franquia.

No artigo 7 da lei vigente, podemos falar de uma modernização da legislação, uma vez que o artigo menciona da possibilidade de as partes do contrato internacional de franquia escolherem a lei aplicável para resolver eventual litigio, assim como o foro competente, podendo inclusive, optar pela arbitragem. 

O jurista Venosa se manifesta positivamente a respeito da escolha da arbitragem como o meio alternativo de solução de disputas nos contratos de franquia, qualificando-o inclusive, como o melhor caminho a ser adotado na temática de franquia. 

O art. 7º, §1º da lei acrescenta que as partes poderão se valer da arbitragem para soluções controvérsias. A lei não precisaria fazê-lo. Todas pessoas maiores e capazes podem optar pelo juízo arbitral nos direitos disponíveis. Melhor entender essa disposição como mera exortação ou aconselhamento para as partes optarem pela cláusula compromissória. A arbitragem, sem a menor dúvida, é o melhor caminho para solução de contendas em matéria de franquia.[viii]

 PRIMEIRAS CONSIDERAÇÕES

Diante do exposto no que refere as atualizações e inovações da nova lei de franquia, chegamos à conclusão de que o legislador buscou brindar maior transparência e segurança jurídica e comercial, tanto para o franqueado, como para o franqueador, atualizando a lei e inserindo-a no contexto da tecnologia, modernidade e internacionalização. 

Quando se fala em benefícios trazidos pela nova lei, podemos afirmar que a segurança e proteção jurídica dos investidores é a principal mudança implementada pela lei.

Portanto, o franqueador deve informar na Circular de Oferta de Franquia, COF, pormenorizadamente todos os detalhes e dados relevantes para a andamento da empresa, isto não apenas, durante o período atual em que o franqueado manifesta seu interesse, mas o histórico empresarial, para que dessa forma, o potencial franqueado tenha uma visão ampla e geral das perspectivas comercias da franquia, tanto a curto, médio e longo prazo, porque uma das principais características do contrato de franquia, é que as partes estão diante de um contrato de execução prolongada. 

Partindo desse pressuposto, que o contrato de franquia é uma espécie de contrato de execução prolongada, prima a vontade colaborativa e solidária das partes, prevalecendo o princípio contratual da boa-fé objetiva, principio este que nenhuma das partes podem se escusar.

Pontoadas essas considerações, passaremos a verificar quais seriam os posicionamentos das partes contratantes da franquia, à luz do atual cenário econômico social, – a pandemia do Covid – 19, onde o mundo empresarial sofreu e sofrerá durante bom tempo as consequências, não pela pandemia diretamente, mas pelas medidas adotadas pelo governo com o intuito de mitigar o contagio e proteger a saúde e a vida da sociedade.         

 OS CONTRATOS DE FRANQUIA E O COVID – 19

O atual contexto decorrente da pandemia do Covid – 19 ocasionou mudanças na economia, na sociedade e em decorrência nos contratos, isto porque em algumas situações afetou a execução dos contratos, precisamente nos contratos de execução prolongada, que em determinados setores conseguiu até gerar o inadimplemento contratual.  

No entanto, é importante mencionar que assim como asseveramos a presença de queda de faturamento em muitos setores comerciais, da mesma forma, podemos afirmar, sem medo de exagerar, que outros setores comerciais estão lucrando tanto ou mais que em “tempos normais”, como se dá no caso das farmácias, por exemplo. 

Diante desse cenário, não podemos falar deliberadamente de “incumprimento contratual por caso fortuito ou força maior, fundamentado na teoria de imprevisibilidade dada a pandemia do covi-19”. Isso porque a regra é que os contratos sejam cumpridos fielmente, conforme os princípios “pacta sunt servanda” e “boa – fé objetiva”.

A título de exemplo, mencionaremos duas situações, a seguir:

      1. Sendo o caso de um franqueado de uma unidade de farmácia requerer redução do valor do aluguel, ou a suspensão do pagamento deste, pleiteando também a isenção ou desoneração das taxas obrigacionais do contrato de franquia, fundamentado na teoria de imprevisibilidade.

Sem dúvida, estaremos diante de uma má-fé processual, já que, nenhuma farmácia esteve prejudicada com a situação ocasionada pela pandemia, pelo contrário, as vendas aumentaram.

      1. Sendo o caso de um franqueado de unidade de venda de roupas de determinada marca requerer a rescisão contratual fundamentado na teoria de imprevisibilidade.

Neste caso, embora não esteja presente os requisitos caracterizadores da teoria da imprevisibilidade, o franqueado poderá requerer revisão contratual, adequando o contrato no atual contexto socioeconômico, pleiteando redução ou suspensão temporária do pagamento de aluguel, redução das taxas obrigacionais com contrato de franquia, etc.    

O professor Claudio Levada, ensina que: “a teoria de imprevisibilidade não é aplicável aos contratos pós – covid, por que ambas partes são prejudicadas, não há onerosidade excessiva, portanto, não há multa. Trata-se de caso fortuito externo e, os artigo 235 assim como 238 do Código Civil tratam da exclusão da obrigatoriedade do devedor quando existe impossibilidade do cumprimento (informação verbal)”.[ix]

Como mencionado, as consequências que cada empresa obteve com relação às determinações legais pelo Poder Público, são diferentes dependendo o rubro de comércio exercido pela empresa, aspectos esses que merecem ser observados.

O site jurídico Migalhas, menciona: 

Em relação aos royalties, a análise se torna mais complexa, e aqui, mais do que nunca, as consequências gravosas provocadas pelos recentes eventos deverão ser observadas à luz do programa contratual específico e do ramo de atuação da franquia. É dizer: franquia de supermercado, por exemplo, não sofre os impactos econômicos negativos diretos da COVID-19 na mesma medida que franquia de academia de ginástica, cuja atividade está severamente comprometida, seja em razão de ordem governamental determinando a redução do horário de funcionamento ou mesmo sua total suspensão das atividades, ou então de drástico cancelamento de matrículas em decorrência da recomendação de isolamento social.[x]

Venosa não ficou alheio ao falar do contrato de franquia e a rescisão por força maior, lembrando que não é apenas um contrato entre franqueador e franqueado, mas que em decorrência dessa relação negocial, temos outros contratos, criando uma rede, o jurista assim o define: 

Advirta-se também, pelo que já foi exposto, que somente o contrato de franquia não exaure as relações negociais entre os interessados. Cuida-se de instrumento destinado a criar uma rede, um sistema, o que requer um complexo negocial e contratual bastante amplo.”

As formas ordinárias de extinção dos contratos também atingem a franquia. Como vimos nas regras referentes à Circular, o contrato deve prever acerca da destinação dos segredos de indústria e da possibilidade de o franqueado estabelecer-se com atividade concorrente. Eventual rescisão por força maior deve ser examinada com rigor, pois somente razões inviabilizadoras, efetivamente, do negócio podem extingui-lo.[xi]

 

Como explanado por Venosa, o contrato de franquia é um sistema empresarial, que daí, nascem outras relações e obrigações contratuais, como sublocação, pagamento de taxas, entre outras, demandando maior complexidade na busca de solução aos problemas suscitados, portanto, requer que ambas partes colaborem nesse sentido, evitando de qualquer forma, se aproveitar da situação, pensando e lembrando que trata-se de uma economia circular, porque somos uma rede contratual e, por tal, merece uma solução plural, pensando na sociedade como um todo, e prevalecendo os princípios da “função social do contrato” e a “boa-fé objetiva”.

O site jurídico Migalhas, menciona a respeito da problemática atual nos contratos de franquia: 

De início, devemos ressaltar que o cenário de instabilidade com o qual nos deparamos demanda, sobretudo, empatia uns com os outros. Assim, o recomendado é que as Franqueadoras, estabelecendo uma rotina diária de comunicação com seus franqueados, criem medidas que visem mitigar o impacto do covid-19 nas suas operações. Nesse sentido, é fato que existe um movimento consolidado pelas grandes Franqueadoras de suspender as cobranças de quaisquer valores referentes aos Royalties. Aqui devemos tecer algumas diferenças entre suspensão versus isenção, uma vez que na primeira hipótese os valores continuam sendo devidos, mas com pagamento futuro, enquanto na segunda hipótese os valores são isentos, não havendo necessidade de pagamento posterior.

Outra forma de colaboração entre as partes é a revisão, por parte daquelas Franqueadoras que forem ao mesmo tempo fornecedores dos produtos ligados às atividades fim das franquias, das políticas de formação de estoques de produtos, suspensão de pedidos de compra, das hipóteses para a devolução de mercadorias, venda em consignação etc.[xii]

Diante do exposto e conforme os exemplos colocados, chegamos à conclusão de que o contrato de franquia deve ser analisado caso a caso, dependendo e considerando suas características comerciais no atual cenário, e evitar a tudo custo, maior desgaste processual, que nem a curto nem longo prazo terá uma solução favorável, muito pelo contrário, tratando-se de contratos comerciais, onde o objetivo é lucro, precisa de uma solução imediata, a qual a obteremos somente com o diálogo e com a revisão contratual. O site jurídico Migalhas destaca:

A solução não é fácil, e torna-se ainda mais desafiadora em razão da lógica de rede em que se opera o sistema de franquias. Por isso mesmo, a revisão do contrato por meio da redução de royalties, da taxa de publicidade e do aluguel há de ser, sobretudo, proporcional à restrição das respectivas contraprestações, sob pena de gerar indesejável desequilíbrio em desfavor dos próprios franqueadores, a quem cabe fornecer suporte não apenas ao franqueado individualmente considerado, mas a toda a rede.

Seja como for, os caminhos propostos devem ser utilizados com parcimônia, apenas e tão somente diante do efetivo impacto negativo dos eventos adversos no âmbito do concreto negócio, e na exata medida de sua repercussão no contrato. Significa dizer que devem ser coibidos, a todo custo, comportamentos oportunistas e desleais de franqueados ou franqueadores que, já não satisfeitos com a relação que se vinha desenvolvendo, tentam se valer do momento crítico para rever o contrato e obter alguma vantagem ilegítima.[xiii]

O conhecido site jurídico Migalhas destaca a importância de negociação nestes casos excepcionais, aquilo com que o Diretor Executivo da Federação Iberoamericana de Franquias (FIAF), José Roberto Fernández, concorda plenamente, senão vejamos:

De todo modo, as circunstâncias apontam que o melhor caminho a seguir é o da negociação, das soluções consensuais pautadas na boafé, que devem ser buscadas não apenas entre o franqueador e um franqueado específico, mas, de maneira geral, entre todos os participantes da mesma rede franqueada, de modo a conciliar e otimizar os interesses em jogo. E é justamente o que afirma José Roberto Fernández, diretor executivo da Federação Ibero-americana de Franquias (FIAF): “Os franqueadores terão a vontade de negociar com seus franqueados as taxas de royalties. Este é um cenário esperado que terá um impacto econômico para franqueadores e franqueados e eles devem ser negociados durante a crise”

A crise vai passar. Ainda que os prejuízos se mostrem mais evidentes neste momento e se somem a cada dia notícias desencorajadoras, fazse imperioso olhar para além das urgências imediatas, a fim de que se enxerguem soluções em prol da preservação das redes de franquias como unidades orgânicas, bem como do próprio sistema de franchising como atividade econômica.[xiv]

Estamos frente a uma situação atípica, em que todos os membros da sociedade e do Poder Judiciário precisam adotar medidas com grande cautela. 

Assim, as partes devem estar dispostas a negociar extrajudicialmente, prevalecendo o acordado entre franqueado e franqueador, e caso não cheguem a um consenso adequado para ambos, poderão requerer a revisão contratual em juízo, onde serão aplicados os princípios contratuais, regendo o equilíbrio econômico-social e a função social. 

O importante site jurídico Migalhas, citou um caso de uma franquia que requereu a revisão contratual, que em decorrência do Decreto Estatual que determinou o fechamento das lojas como medida de isolamento social, viu-se prejudicada financeiramente e não consegue honrar com o pagamento das obrigações contratuais, portanto, pleiteou a suspensão das obrigações do contrato, tais como pagamento de taxas, fornecimento de produtos, entre outros pedidos. A decisão da Magistrada, não podia ser diferente, foi favorável, vejamos o caso: 

Após ser afetada economicamente pela pandemia de covid-19, a franquia acionou a Justiça explicando que sua loja foi fechada em razão das medidas de isolamento social, tendo queda no faturamento do estabelecimento e dificuldades financeiras para arcar com as obrigações firmadas em contrato com a franqueadora. Assim, a comerciante processou a franqueadora pedindo a suspensão das obrigações decorrentes do contrato entre elas. A comerciante também solicitou que a franqueadora não mande mais produtos para atualizar o estoque da loja, uma vez que as vendas caíram. Na análise do caso, a magistrada reconheceu que o cenário de pandemia justifica a revisão do contrato entre a empresária e a franqueadora. “Essa queda de faturamento, para pequenos comerciantes, sabidamente dependentes do caixa diário, gera o caos financeiro que inevitavelmente redunda na quebra”. De acordo com a magistrada, deve haver um equilíbrio contratual entre as partes e, por isso, “a excepcionalidade da situação recomenda a revisão cuidadosa do conteúdo do contrato, adaptada à nova realidade econômica”. Neste sentido, a magistrada asseverou ser mister e razoável a concessão do pedido da autora, haja vista a evidência do baixo faturamento da franquia. Com este entendimento, ficou determinado que as obrigações decorrentes do contrato de franquia sejam suspensas, bem como as cobranças desses títulos pelo prazo de 120 dias. Além disso, a franqueadora deve interromper o envio de produtos para a empresária.[xv]

 

  CONCLUSÃO

Embora a incerteza, ansiedade e o medo por vezes tomem conta da sociedade, não apenas do país, mas do mundo, devemos pensar que é uma fase em que podemos aproveitar como uma oportunidade para tudo, tal e como menciona Winston Churchill: “O pessimista vê dificuldade em cada oportunidade; o otimista vê oportunidade em cada dificuldade.” 

No caso da empresas Franqueadoras, é um momento que pode ser aproveitado para um reanálise interno dos seus negócios visando otimizar recursos, economizando custos, reforçar os vínculos entre os empregados, otimizando metas e incentivos, inovando em formas de atendimento ao cliente, como delivery, e na publicidade usando as redes sociais. 

Diante de um momento atípico, como a pandemia que o mundo está atravessando, faz-se necessário, mais do que nunca, o suporte das partes   Franqueadora junto aos seus Franqueados, agindo com total transparência em prol da empresa e adotar as medidas necessárias visando minimizar os impactos da crise na rede. 

Assim como é importante que a Franqueadora e o Franqueado estejam sob um mesmo objetivo, o Franqueado não pode esquecer de seus empregados, porque por trás de cada empregado, há uma família, portanto, não deve adotar medidas de demissão apenas por “evitar custos” ou “cortar despesas”, e sim, deve adotar medidas de política econômica os quais visam a manutenção do emprego, porém sem demandar custos para a empresa, como o caso de aditamento de férias, ou redução de jornada, entre outros. 

Embora não seja o tópico principal deste artigo a seara trabalhista, faz mister mencionar, uma vez que, decorre do princípio da função social do contrato, gerar ou manter empregos.

Tais medidas, fortalecerá a imagem da Franqueadora perante seus Franqueados e perante o mercado em geral e como equipe se sentirão confiantes e seguros nesse emprego, com o qual gerará maior e melhor produtividade. 

Por fim, a orientação é para que os protagonistas do contrato de franquia, Franqueadora e Franqueador, estejam dispostos a negociar verificando todas as opções possíveis com serenidade, calma e cautela, para que tenham o adequado discernimento e possam adotar as medidas que se façam necessárias para mitigar os impactos da covid-19 nos seus negócios, demonstrando total auxilio e disposição a sua rede de Franqueados e empregados, uma vez que essa grave crise passará, espera-se, o mais breve possível.

E lembre-se…

Não enxergue o problema, enxergue a oportunidade que isso te traz!

Grace Shella Zevallos Velasco,  Advogada Contratualista, Pós graduanda na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo,l  Especialização em Direito Contratual,  Membro Efetivo da Comissão de Direito de Relações Internacionais da OAB/SP. 

 


[i] https://chcadvocacia.adv.br/blog/novaleidefranquia/ Acessado em 14 de julho de 2020 2 http://genjuridico.com.br/2020/01/09/franquiaapontamentosnovalei/ Acessado em 13 de julho  de 2020.

[ii] Nelson Zanzanelli, aula ministrada sob o tema Franquia, do curso de especialização de Direito Contratual, da PUC, no dia 22 de junho de 2020.

[iii] http://genjuridico.com.br/2020/01/09/franquia-apontamentos-nova-lei/ Acessado em 13 de julho de 2020

[iv] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias Administração Pública. 12ed. Editora Forense, 2019. p.251

[v] http://genjuridico.com.br/2020/01/09/franquiaapontamentosnovalei/ Acessado em 14 de julho de 2020.

[vi] Nelson Zanzanelli, aula ministrada sob o tema Franquia, do curso de especialização de Direito Contratual, da PUC, no dia 22 de junho de 2020.

[vii] Nelson Zanzanelli, aula ministrada sob tema Franquia, do curso de especialização de Direito Contratual, da PUC, no dia 22 de junho de 2020.

[viii] http://genjuridico.com.br/2020/01/09/franquiaapontamentosnovalei/ Acessado em 14 de julho de 2020.

[ix] Claudio Levada, aula ministrada no curso de especialização de Direito Contratual, da PUC, no dia 14 de julho de 2020.

[x] https://m.migalhas.com.br/coluna/migalhascontratuais/323008/contratosdefranquiaecovid19 Acessado em 14 de julho de 2020

[xi] http://genjuridico.com.br/2020/01/09/franquiaapontamentosnovalei/ Acessado em 14 de julho de 2020

[xii] https://m.migalhas.com.br/depeso/323697/osimpactosdacovid19nasrelacoesdefranquiaeasmedidasdemitigacao Acessado em 14 de julho de 2020. 

[xiii] https://m.migalhas.com.br/coluna/migalhascontratuais/323008/contratosdefranquiaecovid19 Acessado em 14 de julho de 2020.

[xiv] https://m.migalhas.com.br/coluna/migalhascontratuais/323008/contratosdefranquiaecovid19  Acessado em 14 de julho de 2020.

[xv] https://m.migalhas.com.br/quentes/326326/porquedanofaturamentofranquiaconseguesuspenderobrigacoescontratuais Acessado em 14 de julho de 2020. 

Escrito por Redação

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